Avaliação e modelagem da relação entre Dengue, clima e saneamento em municípios do estado do Rio de Janeiro
Dengue, Saneamento Básico, Saúde Coletiva, Modelagem Matemática, Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico
As epidemias de dengue vêm representando uma crescente ameaça à saúde global em tempos atuais. Sua transmissão, modulada por uma ampla rede de fatores climáticos e socioambientais, cresceu até ultrapassar fronteiras geográficas onde sua presença não era historicamente frequente. Embora haja na literatura debates qualitativos sobre a influência do saneamento básico na sua disseminação, há uma lacuna quanto à incorporação destes parâmetros em análises quantitativas, mais especificamente em modelos mecanísticos.
Partindo da hipótese de que o saneamento básico pode atuar como modulador dos efeitos do clima na dinâmica da doença, o presente trabalho objetivou avaliar a influência de determinantes de saneamento na epidemiologia da dengue e propor uma abordagem para sua incorporação em modelos de transmissão da doença. Duas abordagens metodológicas foram aplicadas no contexto do estado do Rio de Janeiro. A primeira consistiu na aplicação de análises estatísticas para explorar relações entre dados epidemiológicos de dengue, saneamento básico e variáveis sociodemográficas. Surtos epidêmicos ocorridos foram analisados espaço-temporalmente, dados de dengue e saneamento foram correlacionados e uma análise multivariada foi aplicada para identificar e classificar variáveis relacionadas com o saneamento básico que possam ter correlações com a dengue. A segunda abordagem foi a implementação de um modelo mecanístico do tipo SIR-SI-SI (humanos, mosquitos, ovos), que leva em consideração parâmetros biológicos e variáveis externas. O modelo foi calibrado e testado (período 2014-2022) em 6 municípios do estado com distintas características epidemiológicas, urbanas e socioculturais.
Como principais resultados obtidos, a análise multivariada categorizou com sucesso os indicadores de saneamento básico em conjuntos com menores dimensões, que foram interpretados e nomeados, a exemplo de “Cobertura dos Serviços”, “Qualidade da Água” e “Eficiência da Rede”. O modelo mecanístico, por sua vez, foi capaz de reproduzir a sazonalidade da doença com bons resultados, validando sua estrutura. Também foram identificados os parâmetros “Capacidade de Carga” e “Taxa de Sobrevivência Aquática” como chave para a incorporação de determinantes de saneamento em modelos futuros. As análises de correlação revelaram aparentes paradoxos, onde indicadores de melhores serviços de saneamento se associaram a maiores incidências de dengue. Com isso, incutiu-se que a urbanização pode atuar como fator de confusão relevante neste contexto.
A contribuição principal do trabalho é no debate sobre a construção de um framework para integração dos determinantes de saneamento básico na modelagem da dengue, de forma a possibilitar a avaliação de impactos de políticas públicas de saneamento na saúde humana.