A política de comunicação do governo Bolsonaro para a radiodifusão: do discurso de desburocratização aos interesses efetivos em jogo
Radiodifusão; governo Bolsonaro; normas infralegais; captura liberal; mudanças regulatórias; autoritarismo.
Este estudo realiza um levantamento e análise de normas infralegais estabelecidas pelo governo Bolsonaro para o setor de radiodifusão nos primeiros três anos de sua gestão: de 2019 a 2021. A investigação se conecta à busca pela verificação se a estratégia sugerida pelo então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, da chamada “passagem da boiada” – e que se tornou representativa do governo Bolsonaro em diversos campos de atuação – se aplica também ao segmento de rádio e TV. Para isso, a pesquisa desenvolve uma descrição interpretativa das iniciativas implementadas, construída a partir de pesquisa documental e análise de dados, combinada com análise de lógica de atores num campo de conflitos. E se vale da perspectiva teórica do campo das políticas públicas e da Economia Política da Comunicação (EPC), conectando-as à concepção de captura liberal, desenvolvida por teóricos latino-americanos como Mireya Márquez-Ramírez e Manuel Guerrero (2014). Os resultados apontam para uma política de favorecimento do setor empresarial por meio de intensificação e direcionamento da regulamentação, sobretudo de âmbito ministerial, como portarias e instruções normativas, a partir da recriação do novo Ministério das Comunicações, em junho de 2020. A estratégia se vale do perfil de fragmentação regulatória, representativo da legislação brasileira para a radiodifusão, e que se mostra conveniente a essa atuação. Uma lógica que com frequência relativizou o papel do poder público em priorizar o interesse público, submetendo-o a interesses privados direcionados. A pesquisa traz como referência o peso político e simbólico do setor no Brasil, marcado por um histórico de clientelismo e concentração, a intenção do país em integrar a OCDE e a conciliação de interesses que a gestão Bolsonaro buscou com grupos que lhe garantiam sustentação. Conclui-se pelo implemento de uma política voltada à priorização da radiodifusão empresarial – que se vale dos privilégios de sua relação com Estado – e que durante o período se deu combinada com a institucionalização de práticas de personalismo, autoritarismo e proselitismo religioso em relação ao campo de mídia eletrônica do país.