AVALIAÇÃO POR NEUROIMAGEM DAS ALTERAÇÕES CEREBRAIS PEDIÁTRICAS RELACIONADAS A INFECÇÃO POR SARS-CoV-2 DURANTE A GESTAÇÃO
COVID, SARS-CoV-2, gravidez, neonatologia, ultrassonografia, elastografia, neuroimagem.
Fundamentos: Ainda não estão completamente caracterizadas todas as consequências neurológicas da infecção por SARS-CoV-2 durante a gravidez e no período perinatal. No entanto, há evidências recentes de comprometimento da substância branca e prejuízo do neurodesenvolvimento em crianças após infecção materna por SARS-CoV-2. Esses parecem ocorrer como consequência de efeitos virais diretos e de uma resposta inflamatória sistêmica, que pode danificar as células gliais e a mielina, bem como interromper o fluxo sanguíneo regional. Este estudo buscou caracterizar as consequências da condição inflamatória materna e fetal no sistema nervoso central de lactentes após infecção materna por SARS-CoV-2. Metodologia: Foi realizado um estudo de coorte longitudinal prospectivo, no período de junho de 2020 a dezembro de 2021, com acompanhamento de recém-nascidos de mães expostas ou não expostas à infecção por SARS-CoV-2 durante a gravidez. A análise cerebral incluiu dados de ultrassom craniano (US) com escala de cinza, estudos Doppler (colorido e espectral) e elastografia cerebral baseada em ultrassom (por ondas de cisalhamento), em regiões de interesse específicas (ROIs): substância branca profunda, substância branca superficial, corpo caloso, gânglios basais e substância cinzenta cortical. A elastografia cerebral foi usada para estimar a rigidez do parênquima cerebral, que é um quantificador indireto do conteúdo cerebral de mielina. Resultados: Foram incluídas 219 crianças de gravidez unifetal, incluindo 201 de mães expostas à infecção por SARS-CoV-2 e 18 de controles não expostos. A avaliação por neuroimagem foi realizada aos 6 meses de idade cronológica ajustada e demonstrou 18 exames de escala de cinza e 21 exames Doppler anormais. Os achados predominantes foram hiperecogenicidade da substância branca profunda do cérebro e gânglios basais (núcleos caudados/tálamo), bem como redução nos índices de resistência e pulsatilidade do fluxo arterial intracraniano. A circulação cerebral anterior (artérias cerebrais média e pericalosa) apresentou uma gama mais ampla de variação do fluxo quando comparada à circulação posterior (artéria basilar). A análise de elastografia cerebral por onda de cisalhamento demonstrou redução dos valores de Elasticidade (E) no grupo exposto ao SARS-CoV-2 em todas as regiões de interesse analisadas, especialmente nos coeficientes de elasticidade da substância branca profunda (3,98 ± 0,62) em comparação com o grupo controle (7,76 ± 0,77; p-valor <0,001). Conclusão: Esse estudo caracteriza alterações estruturais encefálicas pediátricas associadas à infecção por SARS-CoV-2 durante a gravidez. A infecção materna está associada ao acometimento predominante da substância branca profunda, com hiperecogenicidade regional e redução dos coeficientes de elasticidade, sugerindo diminuição do conteúdo de mielina nas regiões afetadas. Os achados morfológicos em tais casos podem ser sutis, e estudos funcionais, como Doppler e elastografia, têm-se mostrado ferramenta valiosa para identificar com mais precisão quais crianças possuiriam maior risco para danos neurológicos com potencial repercussão clínica.