Radicalização Política e Juventude no Brasil: a formação de identidade coletiva a partir de comunidades gamers no Discord
Nova direita; Ideologia; Gamers; Identidade coletiva; Radicalização; Juventude.
A Internet e as mídias digitais se tornaram espaços sociais de troca e interação entre atores e grupos com significativo impacto no mundo contemporâneo. Desde o início da década de 2010, pesquisas de cientistas sociais identificam na subcultura gamer raízes conectadas a uma tecnocultura tóxica calcada em preconceitos, reacionarismo e intolerância. Tal fato, somado a outros fatores, levou à construção de um ativismo anti-videogames e uma opinião pública estigmatizada sobre jogos eletrônicos, tidos como potenciais produtos indutores de personalidades violentas e antissociais. Isso gerou um afastamento da comunidade gamer dos espaços sociais tradicionais e provocou uma aglutinação dessa população primeiro nos chans e image board e, depois, com o avançar das big techs, em espaços virtuais a partir de aplicativos que permitem a prefiguração de sociedades alternativas. A dicotomia entre a opinião pública e a identidade gamer criou um contexto de polarização e aversão, tendo esta última contribuído para a consolidação do ativismo antissistema.
Sobretudo após a eleição de líderes de extrema-direita ao redor do globo, as comunidades de jogadores vêm sendo investigadas enquanto câmaras de reprodução de ideologias extremistas. Nesse contexto, a presente pesquisa foi pensada para compreender o processo de politização de jovens em espaços digitais povoados por subculturas gamer para responder quais cosmovisões, repertórios e práticas políticas atravessam essas comunidades no Discord do Brasil. A partir da abordagem etnográfica longitudinal, os dados coletados compreendem o período de imersão de quase 3 anos (2020-2023) nos três maiores grupos públicos organizados no aludido aplicativo.
A análise empírica comprova que a comunidade e a subcultura gamer são diversas e plurais, embora impere um estado de hegemonia nos discursos e nas posições de poder. Isso leva à produção e circulação de conteúdo extremista e intolerante, mas que é mascarado por meios de técnicas de memetização para soar engraçado e ser mais aceito pelos integrantes. Em paralelo, os iniciados desenvolvem símbolos e expressões comunicativas próprias, cujo significado não é inteligível para não-iniciados. A partir do conceito de ativismo criptografado, a pesquisa demonstra a existência de fluxos de comunicação para a transmissão de sintagmas reacionários e intolerantes, os quais são mascarados para serem lidos e descobertos apenas por aqueles que conhecerem o caminho das pedras. A partir do Discord, transitam materiais produzidos por YouTubers, sites, blogs e produtores de conteúdo (influenciadores) que trabalham para a difusão da extrema-direita entre os jovens jogadores de videogame no País.