PROCESSO PENAL E ALGORITMOS: O direito à privacidade aplicável ao uso de algoritmos no policiamento.
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Esta pesquisa foi motivada pela percepção de que o direito à privacidade no processo penal não estava acompanhando a digitalização da vida. Apesar da óbvia relação entre privacidade e tratamento de dados pessoais, no processo penal o direito à privacidade não parece se apresentar como instrumento apto a regular ou conter o poder da polícia de operar algoritmos. Dessa angústia, delineei a pergunta que orientou esta pesquisa: como se localiza a teoria jurídica da privacidade em relação às novas tecnologias no processo penal? Chamo teoria jurídica da privacidade o que identifiquei como o senso comum teórico de juristas acerca do direito à privacidade no campo penal. Reduzi o problema do fenômeno tecnológico a algoritmos no policiamento. A proposta metodológica (capítulo segundo) parte do reconhecimento da qualidade instrumental da dogmática, mas não de seu potencial analítico, o que me levou à busca das funções reais do processo penal, mais do que das intencionais. Para preparar o terreno da discussão sobre o fenômeno tecnológico, fiz o confronto de três focos de análise: pano de fundo teórico-político sobre o direito à privacidade (capítulo terceiro); formação histórico-social brasileira no pós-abolição formal (capítulo quarto); e fenômeno empírico das práticas policiais na gestão de intimidades, restringido aqui à questão da violação de domicílio na política de drogas (capítulo quinto). Sobre algoritmos, após dedicar-me a compreendê-los (capítulo sexto), enfrentei os problemas que julguei mais sensíveis, como opacidade/transparência, qualidade de dados e viés racial. Dediquei-me também a examinar governança, gestão da informação e disputa por capital informacional no campo da segurança pública (capítulo sétimo). Explicitada a sugestão que decorre do argumento geral, ampliar a força normativa do direito à privacidade ao policiamento algorítmico, dediquei-me à compreensão: das relações sociais no mundo do big data em sua relação com a corporeidade; do exercício das intimidades enquanto fonte de resistência ou de dominação; do papel do individualismo no não reconhecimento do coletivo como alvo de proteção do direito à privacidade (capítulo oitavo). O direito à privacidade não impede que a dogmática cumpra o papel de garantir as condições para a manutenção da gestão penal das intimidades nas mãos da polícia, fenômeno de atualização histórica, presente precipuamente na política de drogas. À medida que o direito à privacidade passa timidamente a ser reconhecido para fins de contenção do poder policial, como no acesso a domicílio e a celulares, sucedendo aos debates sobre a questão racial, surgem novas possibilidades de vigilância no horizonte tecnológico, como os algoritmos. Diante do seu poder de “aprisionar” subjetividades, emerge também um direito à privacidade que tenha força no nível coletivo, intersubjetivo e imaterial, isto é, que se refira antes às informações pessoais nos sistemas policiais do que a bens que a judicialização criminal individualizada alcança.