Entre utopias e distopias: a imaginação de futuro sob a lógica do capitalismo tardio
Capitalismo tardio; estrutura de sentimento; indústria cultural; imaginação de futuro; distopias
Esta pesquisa analisa e interpreta como as distopias, subgênero das utopias que imagina futuros socialmente pessimistas e totalitários, nasceram e atravessaram diferentes etapas de um processo de teorização que engatilhou suas proliferações e consequente popularização, simultâneo às reverberações e desdobramentos de tais ficções que as colocam como entes sociológicos dentro da estrutura de sentimento do capitalismo tardio. Identifico-as como frutos específicos de tal etapa do capitalismo, como também narrativas que se comportam de forma diletante e que agregam diferentes elementos das ciências humanas em suas construções ficcionais, exigindo uma análise que aborde tais múltiplas características de diferentes áreas, quando atreladas aos universos das ficções científicas, delineando esta pesquisa como interdisciplinar, tendo a sociologia como base empírica e fio condutor que interliga os argumentos e desdobramentos apresentados, entrelaçando os estudos culturais, estudos marxistas e a teoria crítica. Por meio de tais referenciais teóricos, as distopias adquiriram singularidades sociais a partir do argumento que se disseminaram por meio dos próprios trajetos de tal fase do sistema capitalista, como apogeu da indústria cultural, na segunda metade do século XX e nas primeiras décadas do século XXI, e as formas de massificação e homogeneização impulsionadas pelo audiovisual e suas historiofotias reificadas, o atlas mnemosyne obscuro, possibilitando novas formas à dominação ideológica do capital, como a recontextualização de narrativas historiográficas e historiofóticas, e a concatenada instrumentalização dessas como ferramenta de soft power na generalização de totalitarismos, na criação da inevitabilidade distópica do total e no fortalecimento da profecia autorealizada que figura o capitalismo como única opção frente aos totalitarismos genéricos. Entretanto, na medida em que o conceito de distopia atravessa seu processo de teorização, adquire novas características sociais, geográficas e históricas, potencializado pela tradução dessas ficções para diferentes mídias e suas linguagens, aumentando suas complexidades e vozes que as compõem, possibilitando novas abordagens críticas que agora ecoam antigos medos e temores, antes silenciados. Paulatinamente, o progresso técnico gera um descompasso da relação de reciprocidade entre o passado, o presente e o futuro, exibindo os próprios movimentos totalizantes do capitalismo tardio por meio da indústria cultural e dos totalitarismos genéricos que, uma vez efetivos, são agora pastiches da ideia de totalitarismo e são preenchidos pelas próprias concepções do capital, autoreferenciando-se, e abrindo estruturas de oportunidades políticas. Considerando as ficções distópicas como aporias, na medida em que as estruturas de oportunidades políticas abertas não são necessariamente ocupadas e não se desdobram em progressos sociais, somado a falta de agendas políticas, também se desdobram em efeitos contraproducentes, o que igualmente não anula a existência de um pessimismo militante que aponte resquícios de um impulso no imaginar de futuro.