Corpos mastectomizados: reconstruções da feminilidade
Câncer de Mama; Mastectomia; Feminilidade; Gênero;
A pesquisa investigou as representações de feminilidade autoatribuídas por 10 mulheres cis entrevistadas sobre as vivências com o câncer de mama, particularmente no que diz respeito ao procedimento cirúrgico de reconstrução mamária. As colaboradoras compartilharam a experiência com a enfermidade, passando pela trajetória de um cuidado de si, da incorporação de práticas preventivas, do diagnóstico ao tratamento, e das implicações da mastectomia, quando indicado tal procedimento, sobre a imagem corporal. Os relatos contribuíram para uma interpretação da feminilidade associada à autoestima, à maternidade, à sexualidade e às relações institucionais. Foi possível compreender reconstruções da feminilidade nas vivências com o campo médico e a rede de apoio e proteção, implicadas em um conjunto de interpelações, hegemonicamente constitutivo de uma "cultura rosa", com efeitos sobre a autoidentificação como paciente oncológica, o cuidado de si e as percepções corporais. Sendo assim, a feminilidade é atravessada de modo a caracterizar uma luta permanente pela cura, na "batalha" pela sobrevida, seguidos os exames protocolares, e na encarnação de outros significados das mamas conforme os procedimentos estéticos garantidos. Daí, a feminilidade como um sofrimento social. Se há uma representação hegemônica visto a orientação de uma intervenção cirúrgica com implante de silicone, a reconstrução mamária não vai significar a garantia da feminilidade, tal como expresso na legislação, e sim um estado de alma, expresso um processo de encarnação constitutivo de um novo esquema corporal. Uma cultura somática neste contexto do câncer de mama expressa outras feminilidades sobre a visibilidade de um corpo sem mamas. Logo, o reconhecimento das desigualdades produzidas contribui para um debate sobre estima e moralidade de modo a combater efeitos de gênero que constrangem mulheres ora a disfarçarem um corpo sem mamas, seja com próteses externas, ora a sentirem-se obrigadas a aceitar os riscos de procedimentos cirúrgicos reconstrutivos com enchimento.