O SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL E OS APRISIONADOS POR FURTO EM ALAGOAS: TRAJETÓRIAS, AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA E DECISÕES – 2013-2019
Alagoas; furto; aprisionamento provisório; sistema de justiça criminal; trajetória
Esta tese tem como objeto de pesquisa o processo de incriminação e aprisionamento provisório de um contingente de pessoas acusadas por furto no estado de Alagoas, entre os anos de 2013 e 2019. Este trabalho objetivou compreender as razões para que o aprisionamento sem condenação no estado tenha se mantido acima da média nacional durante as últimas duas décadas, não obstante o advento da lei das cautelares (Lei no 12.403/2011), e das medidas alternativas à prisão provisória que essa lei instituiu, bem como apesar da implementação das audiências de custódia (2015). Para responder a essa questão, tomamos como objeto de estudo o crime de furto, que, conforme o artigo no 155 do Código Penal, trata-se de uma conduta pouco ofensiva e não violenta, cuja pena média decorrente de uma condenação, em regra, não enseja numa pena privativa de liberdade em regime fechado, regime no qual os presos provisórios são mantidos. Para tanto, fizemos um levantamento documental de 330 processos sobre furto nos quais 345 pessoas tinham sido presas provisoriamente e requerido a liberdade, via habeas corpus, junto ao Tribunal de Justiça do estado de Alagoas (TJ-AL). A análise desse contingente de processos de furto nos permitiu construir um perfil do acusado que apontava para características socioeconômicas muito desfavoráveis e para situações de extrema vulnerabilidade social no qual essas pessoas se encontravam quando foram presas. A pesquisa documental demonstrou que as prisões provisórias eram mantidas por juízes e promotores na maioria desses casos de furto e, quando demandado, o TJ-AL tendia a negar a maioria dos habeas corpus, mesmo em processos de tentativa de furto. Nosso argumento principal, fundamentado na teoria da prática de Pierre Bourdieu, em resposta à realidade pesquisada, é de que a distância social, econômica, moral, educacional e simbólica entre julgadores e julgados, incorporada nas trajetórias-disposições-corpos desses agentes, impedia ou dificultava a formação de sensibilidades e visões de mundo capazes de incidir no processo decisório dos agentes do sistema de justiça criminal e arrefecer o contingente de prisões sem condenação. Entendemos que essas distâncias são as principais fontes sociológicas para compreender o punitivismo e a seletividade penal. Para tanto, realizamos 14 entrevistas com esses agentes e traçamos suas trajetórias e narrativas, com o intuito de amparar esse argumento.