Trabalho por plataformas digitais e teoria do valor: contribuições para a interpretação do fenômeno.
trabalhos por plataforma digitais;teoria do valor; economia digital; extração de valor
O trabalho por plataformas digitais tem sido interpretado de distintas maneiras
pela literatura especializada. Há estudos que afirmam que todas as atividades realizadas nessas
plataformas devem ser consideradas como uma fonte de trabalho não pago e de extração de valor; há uma quantidade expressiva de estudos que enfatizam que os dados gerados por essas atividades são uma fonte de valor, matéria-prima ou capital, tendo moldado uma “nova economia”; e há ainda teóricos que afirmam que não é possível considerar como produtivos e, portando, criadores de valor, a maioria dos trabalhos realizados por esses trabalhadores. A existência desse debate justifica a necessidade de estudos mais aprofundados para compreender o fenômeno. O objetivo deste projeto de pesquisa é contribuir para a compreensão do trabalho por plataformas digitais, a partir da teoria do valor, de Marx. Para tanto, serão realizadas entrevistas semi-estruturadas com trabalhadores inseridos em cinco tipos plataformas digitais: transporte de passageiros e entrega de alimentos; microtrabalho; logística; serviços freelance e publicidade ou redes sociais. As entrevistas terão o intuito de investigar questões que incidem sobre a extração de mais-valia (prolongamento e distribuição flexível da jornada de trabalho, intensificação do trabalho, forma de remuneração), que caracterizam uma relação de assalariamento (existência de subordinação) e que evidenciam os efeitos da exploração do trabalho (condições deterioradas de saúde e eclosão de lutas sociais). Além disso, serão realizados observação participante do dia-a-dia dos trabalhadores, de protestos, greves e reuniões; e análise de documentos das plataformas digitais, tais como balanços das empresas, e documentos referentes às lutas sociais, protestos e conquistas obtidos pelos trabalhadores. Será ainda realizado um estudo comparativo das entrevistas com trabalhadores de entrega de alimentos em Londres e Brasília. O objetivo é observar se há diferenças na forma de extração de mais- valor nessas duas capitais. As hipóteses sobre as quais se apoiam este estudo são: a) há mais-valor sendo apropriado diretamente do trabalho realizado pelos trabalhadores de transporte de passageiros, entrega de alimentos, microtrabalho, logística e freelancer, mas não na atividade de microinfluenciadores; b) as plataformas digitais que extraem valor-trabalho são monopólios contratantes e intermediários de mão- obra, que subalugam o trabalho de milhões de trabalhadores, fazendo uso de uma remuneraçãofundamentalmente por peça; Espera-se encontrar resultados distintos no que se refere à forma de extração de mais-valor nos diferentes tipos de plataformas digitais. Enquanto nas plataformas de microtrabalho e serviços freelance espera-se encontrar trabalhadores trabalhando em jornadas insuficientes e flexíveis; nas plataformas de transporte de passageiros e entrega de alimentos, espera-se encontrar jornadasexcessivas e flexíveis; nas plataformas de logística, jornadas excessivas e rígidas; e nas redes sociais, espera-se encontrar pessoas que produzem conteúdo em horários flexíveis, mas cuja atividade não se caracteriza como trabalho, não produzindo valor, portanto. Espera-se ainda encontrar diferenças em relação à extração de mais-valor em uma cidade como Londres, no Reino Unido, em relação à Brasília, situada na periferia do capitalismo. Acredita-se que isso se deve à condição de migrante dos trabalhadores em Londres que os impele a fazer longas jornadas de trabalho e dificulta sua organização coletiva, e à redução do tempo de circulação do capital em uma cidade situada em um país capitalista central.