A REPRESENTAÇÃO DO MUNDO RURAL BRASILEIRO NAS COMÉDIAS ROCEIRAS DE MARTINS PENA
Martins Pena; geração vacilante; mundo rural; sociologia da cultura; roceiro
Esta tese investiga as formas de representação do mundo rural brasileiro nas comédias de Martins Pena, situando sua produção no contexto social, cultural e político da primeira metade do século XIX. Parte-se da constatação de que, em meio ao avanço da urbanização, da intensificação da vida letrada e da consolidação da imprensa, formou-se uma visão ambígua do universo rural: ao mesmo tempo espaço de simplicidade e autenticidade e, por outro lado, lugar associado ao atraso e à ignorância. Essa ambivalência é central para compreender a posição ocupada pelo campo nas disputas de identidade cultural em curso no período. O objetivo principal do trabalho é analisar como tais representações foram construídas e encenadas no teatro de costumes de Pena, identificando os recursos cômicos — riso, sátira, caricatura — empregados para caracterizar tipos sociais amplamente reconhecíveis pelo público oitocentista. Para isso, mobiliza-se um amplo corpus documental que inclui peças teatrais, periódicos, crônicas, romances, relatos de viajantes e obras visuais produzidas entre 1831 e 1849, além de bibliografia crítica especializada. Metodologicamente, a pesquisa se inscreve no campo da história cultural e da sociologia da literatura, com especial atenção ao conceito de “pitoresco”, categoria descritiva herdada dos viajantes europeus e reelaborada por Pena em suas farsas roceiras. A análise ressalta também a inserção do dramaturgo nas redes de sociabilidade da chamada “geração vacilante”, formada por jornalistas, escritores e artistas que contribuíram para difundir práticas do romantismo no Brasil. Os resultados evidenciam que o teatro de Martins Pena funcionou como espaço privilegiado de tradução cômica dos conflitos entre campo e cidade, elites e populares, tradição e modernidade. Suas peças, embora fragmentárias e atravessadas pelo tom jocoso, revelam elementos decisivos para a constituição da comédia nacional, ao mesmo tempo em que oferecem uma reflexão crítica sobre tensões sociais, culturais e políticas da época. Conclui-se, assim, que a representação do mundo rural em sua obra contribuiu de modo singular para a construção de uma identidade cultural brasileira em formação.