RIR DA CASTRAÇÃO: A PRESENÇA DE BATAILLE NO “RETORNO A FREUD” DE LACAN
riso, angústia, simbólico, gozo
Levando em conta o conceito de angústia de Jacques Lacan no seu complexo relacionamento com o desejo e o gozo, questionamo-nos aqui acerca da possibilidade de abordar a angústia lacaniana não como um afeto produtor de resignação e melancolia, mas como um afeto que resultaria na experiência alegre do riso. Na tentativa de responder a esse questionamento, a presente dissertação objetiva desdobrar algumas articulações e interfaces entre a angústia e o riso no interior do ensino lacaniano ao tensioná-lo com a concepção de angústia de Georges Bataille. A angústia em Lacan, diferente de outras concepções de angústia, não é sem objeto, sinalizando o papel de um estranho objeto sem consistência objetal responsável pelo seu desencadeamento. A angústia ocorreria quando o objeto a surge ali onde a expectativa do sujeito de sustentar seu desejo num objeto narcísico e especular é frustrada por um furo nesse espelho, submetendo o sujeito desejante a uma experiência dilacerante de desidentificação imaginária e simbólica. Nessa experiência, há sinais de um arranjo, de uma dinâmica pulsional que permite abordar a eclosão desse afeto desde um ponto de vista econômico, pois, bordejado e acessado pela angústia, está o gozo. Ora, uma tal abordagem econômica da angústia parece ter suas origens nas concepções de economia geral e experiência interior de Bataille, para quem esse afeto pode ser vivenciado de maneira servil ou soberana, triste ou alegre. A vivência soberana e alegre da angústia corresponderia ao instante em que a expectativa inerente à dimensão servil do trabalho, movido pelo interdito da angústia diante do nada da morte, é frustrada por um estranho objeto que, segundo Bataille, é sem verdade objetiva. A angústia causada por esse estranho objeto suspenderia, ou melhor, transgrediria esse interdito e transformaria a angústia impotente em riso, podendo adquirir, assim, um estatuto extático, excessivo e criador. Dito isso, entendemos que a compreensão batailleana de angústia, apropriada por Lacan ao seu modo, abre a possibilidade de visualizarmos no seio do ensino do psicanalista a proximidade entre desejo, angústia, gozo, riso e êxtase, e, assim, repensarmos alguns conceitos metapsicológicos centrais.