Memórias Submersas: A Vila Amaury, de dentro e de fora
Vila Amaury; história de Brasília; história oral; memória; segregação.
O caso da Vila Amaury, intencionalmente pré-concebida na região onde em pouco tempo viria a ser o Lago Paranoá, nos instiga a refletir sobre o esquecimento de determinadas memórias em contraponto à persistência de outras. A narrativa oficial de Brasília celebra constantemente os seus títulos de cidade modernista, monumental, racional e planejada, como o ápice da solução para o caos urbano se buscava extirpar há mais de século. A Vila Amaury, por sua vez, se constitui como uma ocupação informal de candangos que se deu durante a construção da capital e que em pouco mais de um ano foi inundada pelo Lago Paranoá, por meio de uma política proposital. Apesar de ser um episódio conhecido, não se vê até então a inserção desta em um debate a respeito da disputa de memória da capital e da ideia de modernidade, com sua subjacente dualidade discursiva moderno-selvagem. Ao dar voz aos relatos orais daqueles que viveram na Vila Amaury, o trabalho busca não apenas reconstruir uma parte periférica da história, mas também questionar e problematizar as narrativas oficiais. Isso é crucial para uma compreensão mais polifônica do passado, colocando em um plano de maior importância às experiências urbanas de pessoas sistematicamente marginalizadas durante o processo de construção física e simbólica do território. A abordagem crítica da oralidade, memória e construção de uma história dita universal é fundamental para esse tipo de pesquisa, pois nos lembra que a história não é apenas sobre fatos objetivos, mas também sobre as experiências de pessoas comuns. Após conhecer o assentamento de dentro e de fora, buscamos, assim, questionar alguns pilares que sustentam a construção de uma narrativa oficial de Brasília e compreender como esses pilares contribuíram para o afogamento simbólico e concreto da Vila Amaury. Essa perspectiva mais ampla e inclusiva enriquece nossa compreensão do passado e nos ajuda a questionar as narrativas dominantes que muitas vezes excluem certas vozes e perspectivas.