O Ligue 180 E A Violência Doméstica: Representações Sociais Nos Relatos Das Vítimas
violência doméstica; Ligue 180; representações sociais; relatos; escuta
Esta dissertação analisa as representações sociais de mulheres em situação de violência doméstica a partir dos relatos de denúncia registrados no canal Ligue 180. A violência doméstica, entendida como fenômeno estrutural e persistente na sociedade brasileira, atravessa desigualdades de gênero, raça, classe e território, o que reforça a importância de observar não apenasindicadores quantitativos, mas também os discursos produzidos pelas próprias vítimas. O objetivocentral do estudo foi identificar e interpretar as representações sociais presentes nas narrativas de denúncia, a partir dos conceitos de ancoragem e objetivação propostos por Serge Moscovici e desenvolvidos por Denise Jodelet. Entre os objetivos específicos, buscou-se: compreender a linguageme as estratégias discursivas utilizadas pelas vítimas; identificar os fatores críticos e os limites de ruptura que motivam a decisão de romper o ciclo de violência e buscar apoio no Ligue 180; e analisar as emoções expressas nos relatos — medo, vergonha, culpa, esperança, entre outras — examinando como esses afetos participam da construção da denúncia e da relação com a atendente. A pesquisa baseou- se na análise qualitativa de 31 relatos feitos ao Ligue 180, registrados no primeiro trimestre de 2025. O corpus foi composto a partir da escuta e transcrição das gravações, posteriormente organizadas em três blocos temáticos e examinadas com o apoio de recursos gráficos. O referencial teórico articula a Teoria das Representações Sociais com aportes das teóricas feministas e das reflexões de Foucault sobre discurso e poder. Os resultados indicam que os relatos analisados expressam, de um lado, a naturalização da violência, e, de outro, rupturas com o silêncio, incluindo situações de violência extrema. Evidenciam, ainda, a relevância da escuta ativa e do reconhecimento da mulher como denunciante e sujeito de direitos. Contudo, observa-se que o processo de formalização das denúncias tende a descaracterizar as falas, na medida em que a adaptação à linguagem institucional frequentemente apaga ou substitui as subjetividades presentes nas narrativas. Conclui-se que o Ligue 180 se configura como instrumento fundamental de escuta e acolhimento, mas sua efetividade depende do fortalecimento da rede intersetorial, da formação das equipes e da preservação da subjetividade das mulheres. O estudo contribui para o debate sobre violência de gênero e políticas públicas ao iluminar a potência e os limites desse canal como instrumento de enfrentamento.