Uma roseira abandonada: sociedade brasileira, intelectualidade e ditadura no romance Quatro-Olhos de Renato Pompeu
Literatura, ditadura, memória
Falecido em fevereiro de 2014 aos 72 anos, o escritor e jornalista Renato Pompeu conquistou três prêmios Abril e um prêmio Esso de jornalismo, este último a mais importante distinção conferida a um profissional da imprensa brasileira. Como escritor deixou 22 livros publicados, entre eles, um romance chamado Quatro-Olhos, de 1976. Quatro-Olhos nos chama atenção pela maneira muito singular com que Renato Pompeu trata o período da ditadura militar no Brasil. Ao optar por uma linguagem repleta de metáforas, Pompeu infunde os impasses da vida moderna e seus dilemas existenciais na situação política do país, de modo que Quatro-Olhos nunca apresenta um sentido sólido, plenamente tangível, de sentido único ou homogêneo, como se ao comentar a ditadura, Pompeu falasse da própria condição humana. Em Quatro-Olhos, o personagem-título se vê angustiado, deprimido e perturbado tentando reconstituir a memória de um livro que se perdeu quando o protagonista foi levado por agentes da repressão. O livro perdido funciona como uma metáfora daquilo que o narrador pensa sobre a sociedade, como ela é, como deveria ser e quão distante ele está de responder essas questões. Em um período em que o Estado pratica perseguições, torturas e assassinatos, Quatro-Olhos não é só uma forma de escapar à censura, mas também uma forma de expressar aquilo que está além da linguagem, além até daquilo que chamamos de humanidade. Por meio de Quatro-Olhos faremos a análise de algumas ideias e comportamentos da sociedade brasileira dos anos 60-80, da relação entre a sua organização social e a política repressiva do Estado.