Saude mental e maternidade entre brasileiras: (má) distribuição de tempo e investimentos nos cuidados de si, dos outros e demandas parentais
maternidade; saúde mental; determinantes sociais; desigualdade de gênero; cuidado.
A presente pesquisa tem como objetivo identificar como gênero participa na configuração
das disparidades de investimento tanto de tempo quanto de energia pessoal nos processos de cuidado
doméstico, familiar e com os filhos, e seus impactos na saúde mental e bem-estar das mães brasileiras. Trata-
se de uma pesquisa de método qualitativo, realizada em duas etapas. A primeira etapa consistiu em um
estudo teórico realizado por meio de revisão integrativa da literatura sobre saúde mental materna. A segunda
etapa consistiu em uma pesquisa qualitativa, que utilizou, como ferramenta de coleta de dados o “diário
solicitado” (Elliott, H. 1997). Trata-se de solicitar a cada mulher que registre diariamente tanto as atividades
realizadas quanto os pensamentos e sentimentos envolvidos de que ela tem consciência. Buscou-se
compreender em profundidade o cotidiano das participantes, bem como os sentimentos e as emoções
decorrentes do exercício da maternidade e dos afazeres diários de cuidado consigo e com os outros. Para
essa etapa, participaram 21 mães de diferentes regiões do Brasil. Os dados foram analisados a partir do
referencial teórico da Análise Temática na perspectiva de Braun e Clarke (2006). Tanto a análise dos diários
quanto os achados da literatura científica internacional identificaram que as mães vivem sobrecarga de
trabalho, exaustão, estresse, tensão, sintomas de ansiedade e depressão, e relatam sentimento de tristeza e
insatisfação com a vida. A análise dos dados provenientes dos diários solicitados identificou que as
responsabilidades do trabalho de cuidado e dos serviços domésticos centralizadas na figura das mães impõe
a elas a condição de ter que configurar sua rotina exclusivamente vinculada às necessidades dos filhos, -
filhocentramento - o que foi associado a quadros de exaustão e sofrimento psíquico. No entanto, observou-
se que, ao buscarem realizar atividades voltadas para si, “egocentradas”, as mulheres relataram sentimento
de culpa por não estarem dedicadas aos cuidados dos filhos. Identificou-se também que o sofrimento mental
vivido por elas pode ser agravado a depender de intersecções entre diferentes determinantes e
condicionantes de saúde identificados como: A) Condição socioeconômica; B) Participação paterna; C)
Condição do Filho; D) Rede de apoio/afeto; e E) Políticas públicas. Os resultados apontam para a
necessidade de olhar a saúde mental materna como uma questão coletiva, atravessada pelos ideais normativos dos papéis de gênero, o que exige políticas públicas intersetoriais, que promovam enfrentamentos das desigualdades estruturais sociais e de gênero.